8 de abril de 2012

Semana 15
Os jovens de Clichy-sous-Bois



Clichy-sous-Bois é cenário sombrio, sob a mancha cinzenta de prédios degradados, repletos de famílias numerosas, pobres, vindas de longe, com filhos que não conhecem nenhum país de origem senão a França.
A morte dos dois adolescentes, Zyad Beena, de 17 anos, e Bouna Traoré, de 15 anos, electrocutados num transformador de alta tensão quando se escondiam da polícia, ainda pesa. Nessa noite, não houve qualquer explicação da polícia, do Governo, de qualquer instituição. A mágoa tomou a forma de “revolta social” que incendiou nesse Outono de 2005 primeiro Clichy-sous-Bois, no Leste de Paris, e depois os subúrbios de várias grandes cidades da França. Clichy-sous-Bois mistura os sintomas da problemática integração de imigrantes com os da pobreza e do desemprego, cuja taxa média de 26 por cento é quase três vezes superior à média nacional.
As pessoas de Clichy vivem num enclave, sem transporte directo que as ligue à capital, sem portas de saída para novas oportunidades, cortadas do mundo que os rodeia. Esta é uma cidade jovem, onde quase metade da população tem menos de 25 anos.
As torres ergueram-se na desordem e a cidade aumentou. Um imenso espaço verde, onde um grupo de mulheres em traje muçulmano passeia, podia ter sido transformado num jardim. Mas também ele parece só estar ali por acaso, desalinhado, ao abandono. Nada nesta cidade parece ter sido pensado para acolher pessoas. É generosa para os que chegam acolhidos pelos que já aqui estão. Mas algo de impiedoso instala-se na vida dos que aqui passam a viver.
Samir Mihi é um dos fundadores da aclefeu (Association, Collectif, Liberté, Égalité, Fraternité, Ensemble, Unis) criada para que as mortes de Zyad e Bouna não tenham sido em vão. Toda a cidade os conhecia e a eles se refere como “os nossos filhos”.
“Podia ser bom viver em Clichy. Mas as pessoas foram deixadas à sua sorte aqui", conclui Samir. “As paredes têm lepra, nas casas não há água, os prédios não têm elevador”, descreve. “Depois admiram-se que as pessoas sintam ódio”.
Sofiane assume-se como porta-voz de um pequeno grupo de alunos à frente do Liceu Alfred Nobel. “Vivemos nos subúrbios, por isso não existimos. Vivemos na única cidade onde não existe nada”. Os jovens pouco saem de Clichy. Cansados dos controlos de identidade, quase nunca vão a Paris. “A polícia abusa. E é só por causa da cor que temos na pele”.

Ana Dias Cordeiro
a partir de reportagem em França para o jornal Público, em Maio de 2007

Rodrigo Saias
ilustração inédita, 2010

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