7 de outubro de 2012

semana 41
Quanto vale uma torneira?


Em Qena, no Sul do Egipto, há uma mulher com um tesouro para revelar. Quando se entra em sua casa, aponta para a torneira como quem mostra um quadro de Picasso, porque esta torneira mudou a sua vida. As filhas deixaram de andar quilómetros todos os dias para ir buscar água e passaram a ir à escola.
Catarina Albuquerque, perita independente da ONU para o direito à água, não se esquece desta mulher. A torneira foi financiada pela UNICEF e a família ficou a pagar um ou dois dólares de prestação, durante 24 meses. “Podem não ter dinheiro para comprar muita comida, mas de certeza que vão pagar a torneira”. Continuava sem haver casa de banho, mas pelo menos a torneira já trazia água para beber e cozinhar.
Para além do Egipto, Catarina Albuquerque visitou a Costa Rica, Bangladesh, Eslovénia e Japão, a preparar relatórios para a ONU sobre o acesso à água e ao saneamento. Desde 2008, quando começou o seu mandato, esta jurista tem defendido que a água é um direito humano consagrado, tal como o direito à habitação à alimentação. “É impossível ter acesso a um nível de vida adequado sem água ou saneamento”.
A Assembleia Geral da ONU aprovou em Julho de 2010, por 122 votos a favor e 41 abstenções, uma resolução em que considera o acesso à água e ao saneamento um direito fundamental, mas pela frente há ainda um longo caminho. Todos os anos morrem 1,5 milhões de crianças com menos de cinco anos por doenças relacionadas com a falta de água potável, há 884 milhões de pessoas com difícil acesso a água e 2600 milhões que não têm condições de saneamento, o que significa 39 por cento da população mundial. A cada 20 segundos morre uma criança por falta de saneamento ou água potável.
Catarina Albuquerque espera que a resolução da ONU ajude a não deixar esquecer este direito. Durante a sua missão já enviou dezenas de cartas a pedir para visitar países de várias latitudes, porque a falta de acesso à água não é só um problema de África. Na Eslovénia, por exemplo, viu as comunidades ciganas a caminhar durante duas horas para conseguir água potável. E no relatório que há-de apresentar em Outubro de 2011 falará dos muitos obstáculos que encontrou e de algumas boas práticas, como a torneira de Qena ou as instalações sanitárias que custam apenas um dólar e alguma imaginação.

Isabel Gorjão Santos
história inédita, 2010

Gonçalo Cunha de Sá
fotografia inédita, 2010

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