22 de janeiro de 2012

semana 4
A música como resistência









Podia estar com a sua viola de arco numa orquestra, andar por França em concertos, ter segurança, conforto, uma carreira. Mas continua a viver entre campos de refugiados e cidades ocupadas da Cisjordânia, com grande obstinação. Aos 30 anos, Ramzi Aburedwan é uma daquelas raras pessoas que sabe porque faz o que faz.
“Atirar pedras é uma forma de dizer que não e fazer um concerto num ‘checkpoint’ ou no muro [que Israel construiu à volta dos territórios], é uma outra forma de dizer que não. Dar às crianças palestinianas a possibilidade de viver uma outra infância, que não quer dizer atirar pedras, também é uma forma de resistir. De dizer que nos querem fazer sentir mortos mas não conseguirão”.
Ramzi tinha oito anos quando a Primeira Intifada rebentou, e um amigo morreu a seu lado, atingido por soldados israelitas. Pegou instintivamente numa pedra, e essa imagem, captada por um fotógrafo, correu mundo. Tornou-se um líder infantil na intifada.
Aos 11, o pai foi morto e Ramzi passou a viver com os avós no campo de refugiados de Al Amari, perto de Ramallah. Distribuiu jornais, desenvencilhou-se. Até que um músico palestiniano residente na Jordânia lhe mostrou uma viola de arco. Ramzi avançou de professor em professor, de bolsa em bolsa, dos Estados Unidos a França. Estudou viola mas também “buzuk”, uma espécie de alaúde. Fundou o grupo Dalouna, com música tradicional e original. Organizou idas de músicos à Palestina, para “ateliers” e “workshops” com crianças. Tudo o que absorveu foi sendo aplicado nesta ideia: uma escola-centro cultural, a Al Kamandjâti, capaz de trazer as crianças para a música, mas também de ir ter com elas.
“Politicamente, não confio em ninguém. Só acredito nas crianças, em preparar uma nova geração, ajudá-las a saberem mais, a serem pacíficas”.
Desde que abriu, em 2005, a Al Kamandjâti abriu seis delegações pela Cisjordânia. Já soma mais de 500 estudantes, e envolveu milhares em acções. Todos os anos organiza a Festa da Música e Ramallah pára, com concertos em simultâneo. Para tudo isto, tem apoios palestinianos e estrangeiros, mas não um financiamento a longo prazo, e o projecto é para hoje, mas também para amanhã. Ramzi vai lá estar.
Sempre que virem este nome – Ramzi Aburedwan –, é da Palestina que ele vem e à Palestina voltará.

Alexandra Lucas Coelho
a partir de texto publicado em “Oriente Próximo”, Relógio D’Água, 2007
fotografia publicada em “Oriente Próximo”, Relógio D’Água, 2007

1 comentário:

  1. A música ao serviço das crianças. Realmente, políticamente não se pode confiar na ordem estabelecida. O futuro depende da forma como as novas gerações forem educadas.

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