Quando chegar a sua vez, Nora Mülhpforte, 82 anos, em parte vividos num palco, quer passar aqui os seus últimos dias. “Quando já não puder dançar”, sublinha, coquete, a velha profissional de danças de salão que inaugurou em Berlim o primeiro lar europeu para lésbicas e gays com um sentido tango argentino.
Nora tem uma dessas biografias não lineares que dificultam a integração num lar tradicional onde se folheiam álbuns fotográficos durante a semana, e aos domingos e feriados se espera a visita dos netos e afilhados. Num outro tempo, foi casada e teve dois filhos, mas depois da morte do marido, em 1955, Nora descobriu o amor pelas mulheres. “Eu sou uma mulher que ama mulheres”. E agora, que perde a independência, não quer ter de omitir a sua história.
A opção de Nora não é pacífica. Cansada de responder eternamente às mesmas perguntas, e explicar que a sua companheira, Gabi Stiller, 20 anos mais nova, não é sua filha, Nora vê- -se agora também atacada por membros da comunidade gay que receiam as consequências
de “soluções segregacionistas” e a destruição de décadas de trabalho em prol da integração, com a abertura de um “parque temático”.
Sem paciência nem energia para se defender e justificar mais uma vez, a velha dançarina, que optou por viver fora do compasso, apenas tem um desejo: poder viver num lar onde a vida continue como era antes. Viver e deixar viver.
Lina de Lonet Delgado
a partir da reportagem publicada no jornal Expresso/Única, 28 de Dezembro de 2008
Marcel Steger
publicado no Expresso/Única, 28 de Dezembro de 2008
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